Jerónimo de Sousa responsabiliza Governo
pela situação na TAP

Fúria privatizadora chega<br>ao Oceanário

O Se­cre­tário-geral do PCP res­pon­sa­bi­liza o Go­verno pela «de­ses­ta­bi­li­zação e con­flito» na TAP, sus­ten­tando que na gé­nese do pro­blema está a «fúria pri­va­ti­za­dora» em que aquele mer­gu­lhou, por «opção po­lí­tica de fundo», mais do que por «fa­na­tismo ide­o­ló­gico».

O País tem o di­reito de re­ca­pi­ta­lizar uma em­presa fun­da­mental para a eco­nomia como é a TAP

«O pro­blema de fundo é esta fúria pri­va­ti­za­dora. Foi a ANA, os CTT, a PT, o resto da EDP. Agora querem pri­va­tizar a Água, os re­sí­duos só­lidos, os trans­portes, até o Oce­a­nário, ima­gine-se!», sa­li­entou Je­ró­nimo de Sousa. E não es­con­dendo a sua in­dig­nação, pros­se­guiu: «Mas porque carga de água o Oce­a­nário? Não me diga que é por causa do mi­lhão de euros de lucro que deu?», in­quiriu, antes de ad­mitir que por este ca­minho «qual­quer dia ainda vamos ver uma placa na Torre dos Clé­rigos ou na Torre de Belém a dizer "vende-se, as­sina: o Go­verno PSD/​CDS-PP"».

O líder co­mu­nista in­ter­pe­lava o pri­meiro-mi­nistro, dia 6, no de­bate quin­zenal onde o tema TAP emergiu para pri­meiro plano, face a um con­flito por esses dias em pleno ponto de ebu­lição.

En­ten­dendo que tudo co­meça com o anúncio da pri­va­ti­zação – e esta, in­sistiu, é a «questão de fundo» –, Je­ró­nimo de Sousa instou por isso o chefe do Go­verno a não «vir com a greve dos pi­lotos, in­de­pen­den­te­mente do juízo crí­tico que po­demos e de­vemos fazer em re­lação a al­guns dos ob­jec­tivos que animam essa greve».

Os tra­ba­lha­dores o que sabem re­la­ti­va­mente a ou­tras em­presas de ban­deira na União Eu­ro­peia que foram ab­sor­vidas em pro­cesso de pri­va­ti­zação por grandes grupos eco­nó­micos é que de­pois foram afun­dadas, «dei­xando atrás de si um rasto de des­truição e mi­séria», su­bli­nhou o líder co­mu­nista, para quem a «ex­pe­ri­ência dos ou­tros» com­porta en­si­na­mentos que con­ferem le­gi­ti­mi­dade e fun­dadas ra­zões à pre­o­cu­pação dos tra­ba­lha­dores da TAP.

Afirmar a so­be­rania

Antes, di­ri­gindo-se a Passos Co­elho, fora já pe­remp­tório em des­mentir que ao Es­tado es­teja ve­dada a pos­si­bi­li­dade de re­ca­pi­ta­lizar a em­presa. E a este pro­pó­sito re­feriu que ao con­trário do Go­verno, que nunca fez a per­gunta à União Eu­ro­peia, os de­pu­tados co­mu­nistas me­xeram-se e ques­ti­o­naram Bru­xelas sobre o as­sunto. E a in­for­mação que ob­ti­veram, de­ta­lhou, foi a de que o Go­verno por­tu­guês não efec­tuara qual­quer di­li­gência junto da UE sobre esta ma­téria. Mais, fi­caram a saber que em 15 anos foram des­pa­chados 11 pro­cessos de re­ca­pi­ta­li­zação de em­presas dos países da UE, como foi por exemplo o caso da Ali­tália (re­cebeu 766 mi­lhões de euros), da Malév hún­gara (145 mi­lhões), ou da Lot po­laca (200 mi­lhões).

Daí Je­ró­nimo de Sousa ter con­cluído, in­de­pen­den­te­mente do que a UE queira ou não impor, que, por «ra­zões de so­be­rania», «temos o di­reito de salvar, de re­ca­pi­ta­lizar uma em­presa fun­da­mental para a nossa eco­nomia».

Ab­di­cação

Passos Co­elho ad­mitiu que o País pode so­li­citar à Co­missão Eu­ro­peia, ao abrigo do re­gime de au­xí­lios de Es­tado, au­to­ri­zação para fazer a re­ca­pi­ta­li­zação da TAP, desde que es­teja dis­po­nível para a re­es­tru­turar.

Nas em­presas onde essa re­es­tru­tu­ração ocorreu, adi­antou em tom chan­ta­ge­ador, terá ha­vido uma re­dução em quase 40 por cento nas rotas, fun­ci­o­ná­rios e ope­ra­ções, in­si­nu­ando que seria também esse ine­vi­ta­vel­mente o des­fecho que ocor­reria na TAP.

Si­tu­ação que o chefe do Go­verno aceita sem pes­ta­nejar como se de­pre­ende da sua afir­mação de que «não po­demos deixar de estar su­jeitos às re­gras» da União Eu­ro­peia. «É mesmo assim, es­tamos su­jeitos ao que é bom e ao que é mau, como no País nos su­jei­tamos às coisas me­lhores e às coisas pi­ores», disse, ex­pres­sando o que só pode ser visto como uma pos­tura de re­sig­nada su­jeição aos di­tames ex­ternos e de ab­di­cação do in­te­resse na­ci­onal.

E re­cusou que o Go­verno seja o res­pon­sável pela de­ses­ta­bi­li­zação da TAP, en­dos­sando-a aos pi­lotos que fazem greve, antes de as­se­verar que a pri­va­ti­zação é o «me­lhor ca­minho para o fu­turo da em­presa».

De­fender a TAP

«Foi pena que não ti­vesse ci­tado o exemplo da pri­va­ti­zação da Ibéria e todas as con­sequên­cias de des­pe­di­mento, de en­cer­ra­mento, em re­sul­tado de uma falsa re­es­tru­tu­ração», re­plicou Je­ró­nimo de Sousa, que rei­terou a po­sição do PCP de de­fesa da re­ca­pi­ta­li­zação numa «pers­pec­tiva de de­sen­vol­vi­mento da pró­pria em­presa». E an­te­cipou que a ban­cada co­mu­nista apre­sen­tará uma ini­ci­a­tiva na AR exac­ta­mente nesse sen­tido, por con­ti­nuar a con­si­derar que o País pre­cisa da TAP, pú­blica, na­ci­o­na­li­zada, uma em­presa de ban­deira que sirva os in­te­resses na­ci­o­nais.

Dois pesos e duas me­didas

In­tro­du­zida no de­bate por Je­ró­nimo de Sousa foi ainda a re­cente de­cisão go­ver­na­mental de con­ferir 85 mi­lhões de euros de be­ne­fí­cios fis­cais ao Novo Banco, me­dida que em sua opi­nião re­vela de forma in­so­fis­mável a po­lí­tica de «dois pesos e duas me­didas», em que «para os po­de­rosos há sempre di­nheiro dis­po­nível».

«Ex­plique lá porquê!, se­nhor pri­meiro-mi­nistro», de­sa­fiou, en­qua­drando o seu ponto de vista: «Então aqui já não há di­fi­cul­dades, há di­nheiro, mas não há di­nheiro para de­volver sa­lá­rios aos tra­ba­lha­dores, para de­volver aquilo que foi rou­bado nas re­formas e pen­sões?!».

In­ter­pre­tando este caso como mais um exemplo con­creto da po­lí­tica de «dois pesos e duas me­didas», o Se­cre­tário-geral do PCP deu a co­nhecer de se­guida o teor de uma ex­po­sição as­si­nada por 56 fun­ci­o­ná­rios dos ga­bi­netes do pró­prio Go­verno, onde estes se queixam da pro­funda dis­cri­mi­nação de que estão a ser alvo em vir­tude de não lhes es­tarem a ser re­postos, como pro­me­tido, os cortes sa­la­riais ao mesmo ritmo de ou­tros tra­ba­lha­dores da ad­mi­nis­tração pú­blica.

O pri­meiro-mi­nistro, na ré­plica, pro­cu­rando jus­ti­ficar o di­nheiro dado ao Novo Banco, ar­gu­mentou que «não houve ne­nhuma dis­cri­ci­o­na­ri­e­dade», «não houve ne­nhuma ex­cepção», atri­buindo aos ser­viços da Au­to­ri­dade Tri­bu­tária a au­toria da pro­posta, nos termos «pre­vistos no pró­prio Có­digo dos Be­ne­fí­cios Fis­cais».

Sobre a si­tu­ação do pes­soal dos ga­bi­netes, la­có­nico, li­mitou-se a dizer que estes, como «todos os ti­tu­lares de cargos po­lí­ticos têm desde 2010 uma re­dução adi­ci­onal de cinco por cento sobre as suas re­mu­ne­ra­ções», me­dida que foi ins­ti­tuída pelo an­te­rior go­verno e que está ainda em vigor.

Mas para Je­ró­nimo de Sousa estes são casos que mos­tram a que ponto chegou a «di­mensão do iso­la­mento so­cial e da der­rota» desde Go­verno, tendo em conta a sua po­lí­tica que «atinge sempre os mesmos do cos­tume – quem tra­balha ou quem tra­ba­lhou –, man­tendo in­to­cável e re­for­çando o poder dos po­de­rosos».

E é também por essa razão que o PCP con­si­dera ser este um Go­verno que «tem os dias con­tados», adi­antou o líder co­mu­nista, que acusou o Go­verno e a mai­oria de terem um dis­curso que re­vela des­co­nhe­ci­mento sobre a re­a­li­dade em que se movem. E isso é «ter­rível», ad­vertiu, di­ri­gindo-se a Passos Co­elho, «porque, um dia, quando per­ceber, vai ser res­pon­sa­bi­li­zado, mesmo já não sendo pri­meiro-mi­nistro». «Porque aquilo que está a fazer com as pri­va­ti­za­ções, com os di­reitos de quem tra­balha, com os sa­lá­rios, re­formas e pen­sões, é uma ten­ta­tiva de im­pedir que Por­tugal tenha fu­turo», con­denou Je­ró­nimo de Sousa.

Do roto para o nu

No de­bate ouviu-se a acu­sação da mai­oria e do Go­verno de que ti­nham sido os exe­cu­tivos do PS a tor­narem a dí­vida in­sus­ten­tável. Je­ró­nimo de Sousa, não dando par­ti­cular valor à troca de mimos (em­bora não es­con­dendo al­guma per­ple­xi­dade por esse re­co­nhe­ci­mento de Passos Co­elho quanto à in­sus­ten­ta­bi­li­dade da dí­vida), en­tendeu ser opor­tuno lem­brar so­bre­tudo que, com este Go­verno, a dí­vida au­mentou, tal como au­mentou o ser­viço da dí­vida.

E com os olhos em Passos Co­elho e logo de se­guida na ban­cada do PS, foi com pro­pri­e­dade que achou que é «caso para dizer: diz o roto ao nu por que não te vestes tu».




Mais artigos de: Assembleia da República

Banca precisa de controlo público

O PCP va­lo­riza o tra­balho da co­missão par­la­mentar de inqué­rito à gestão do BES e do GES criada por pro­posta sua, en­ten­dendo que o País dispõe hoje de um ma­nan­cial de in­for­mação muito útil sobre o que se passou, mas de­fende que é «pre­ciso ir mais longe», con­cre­ti­zando de­sig­na­da­mente o «con­trolo pú­blico da banca».

Maioria e PS recusam revogação

O pro­jecto de lei do PCP que de­ter­mi­nava a re­vo­gação das taxas mo­de­ra­doras e a isenção de pa­ga­mento no trans­porte de do­entes não ur­gentes foi chum­bado na AR pela mai­oria PSD/​CDS-PP e pelo PS.

AR aprova voto de congratulação

O Parlamento aprovou, dia 8, um voto apresentado pelo PCP assinalando os 70 anos da vitória sobre o nazi-fascismo. Deram o sim todas as oposições (o PS com ressalvas), abstendo-se PSD e CDS-PP, que anunciaram a apresentação de declarações de voto, por discordância...

Injusta e desadequada

O decreto-lei sobre a cópia privada, no âmbito do código dos direitos de autor, e que tinha sido vetado em Março pelo Presidente da República para reapreciação, voltou a ser aprovado em plenário, sexta-feira, 8, pela maioria PSD/CDS-PP, com os votos contra do PCP,...

Estatutos de Ordens profissionais

Diplomas sobre os estatutos da Ordem dos Advogados, da Ordem dos Solicitadores e da Ordem dos Notários foram aprovados dia 30 de Abril, na generalidade, pela maioria PSD/CDS-PP, sem qualquer voto favorável das oposições. No caso da Ordem dos Notários, PCP e PEV votaram contra,...

Pesar por Oscar Mascarenhas

A Assembleia da República aprovou, dia 8, por unanimidade, um voto de pesar e cumpriu um minuto de silêncio pela morte do jornalista Oscar Mascarenhas. Antigo presidente do Conselho Deontológico do Sindicato dos Jornalistas, Oscar Mascarenhas começou a trabalhar no jornal A Capital,...